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  • Foto do escritorLuísa Moreira

Alguns desafios da herança digital

Atualizado: 18 de mai. de 2021

A herança digital é, sem dúvida, um assunto sobre o qual deveremos nos debruçar ao longo desses próximos anos, tendo ainda muitos pontos em aberto. Isso porque ela envolve diversos bens imateriais, cujos titulares estão começando a falecer em tempos muito recentes. Senhas, arquivos, redes sociais, e-mails, acesso a conversas com terceiros, criptomoedas, são exemplos dos bens sujeitos a serem transmitidos na era digital. O desafio é de que maneira efetuar a sucessão. Admitir que todo e qualquer bem do falecido seja transmitido certamente não é uma opção, mas então, qual a solução jurídica para tanto?

A solução que parece mais adequada é a divisão entre os bens de natureza patrimonial, os de natureza personalíssima e os de natureza híbrida, para que então somente os de natureza patrimonial fossem transferidos aos herdeiros. Isso porque, vale lembrar, apenas os direitos de natureza patrimonial são transmissíveis aos herdeiros, sendo os direitos da personalidade intransmissíveis e irrenunciáveis. Busca-se, assim, compatibilizar os direitos dos herdeiros à herança e também os direitos do falecido como honra, imagem, privacidade.

Ao admitir o contrário, permitindo-se que todo e qualquer bem seja transmitido aos sucessores, estes teriam acesso, por exemplo, às conversas travadas entre o de cujus e terceiros, o que gera uma dupla violação ao direito à privacidade: a do falecido e a do terceiro. Essa alternativa não parece adequada. A premissa básica deve ser a proteção do mencionado direito.

Todavia, apesar de parecer simples transmitir criptomoedas, por seu caráter patrimonial, e deixar de transmitir, por exemplo, acesso aos directs do Instagram, ainda assim há diversas questões a serem analisadas, não só em relação aos bens digitais exclusivamente patrimoniais, mas principalmente os de natureza híbrida.

Quando falamos em criptomoedas, é mais fácil se imaginar sua sucessão, em razão justamente de sua natureza exclusivamente patrimonial. Contudo, o grande desafio é associar a chave de acesso ao titular falecido. Pela própria natureza da tecnologia blockchain, sem que o titular forneça expressamente a informação, o dinheiro se perde, pois não se consegue associar o conjunto de números e letras que representam o titular no sistema com determinada pessoa física.


Atualmente, sem regulamentação que estabeleça algum tipo de transferência automática da chave de acesso à carteira do de cujus, é altamente recomendável que se realize um planejamento sucessório de tais bens, a fim de se evitar sua perda. Assim, ainda quando se trata de bens digitais patrimoniais, a sucessão pode se tornar muito complexa, com diversas dificuldades, inclusive a de se definir qual é a legítima.

Por outro lado, quanto aos bens de natureza híbrida, o problema parece ser também de muito difícil solução, a exemplo de uma rede social de uma pessoa famosa com milhões de seguidores, em que ela própria exerce a administração, tendo diversos patrocinadores, ou até mesmo ganhando comissão sobre vendas de determinado produto. O desafio é como efetuar eventual sucessão, permitindo-se que os herdeiros recebam grandes recursos monetários que lhe seriam de direito e, ao mesmo tempo, garantir o direito da personalidade do falecido (e também de terceiros).

Acredito que a premissa deve ser a proteção dos direitos da personalidade. Não podemos simplesmente admitir que as pessoas farão declarações para preservar seus direitos em vida, pois não faz parte da cultura brasileira. Devemos preservar tais direitos independentemente de qualquer manifestação, até mesmo porque, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis. Enquanto o ordenamento jurídico não avança, vale lembrar, é altamente recomendável a realização de planejamento sucessório.

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